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Dívida zero e olho do dono: como o Cuiabá conseguiu seu 1º lucro da história

Por Da redação Exame.com
Publicado em 12-06-2023 às 09:31hrs
Em entrevista exclusiva a EXAME, Cristiano Dresch, vice-presidente do Cuiabá, revelou os segredos do clube menos endividado do Brasil para ter o primeiro lucro da história -- e os planos para o futuro

Conhecido pelo agronegócio pujante, o Mato Grosso também pode ser sinônimo de futebol. O estado tem pela primeira vez na história um time na série A do Brasileirão por três temporadas consecutivas. O Cuiabá, clube-empresa antes disso virar "moda" no Brasil, tem como principal objetivo dar protagonismo para uma região sem tradição no futebol.

No mês de maio, o clube divulgou o seu balanço de 2022 e apresentou números históricos. Pela primeira vez, em 21 anos de vida, o Cuiabá registrou lucro, com um saldo positivo de R$ 25 milhões. A receita do clube foi de R$ 123 milhões no período, um recorde para a agremiação.

Os números do último ano trouxeram um acréscimo de praticamente o dobro da arrecadação em relação a 2021, que foi de R$ 63,7 milhões. Dos R$ 123 milhões arrecadados, R$ 87,5 milhões foram de direitos de transmissão de televisão. Os patrocínios aparecem em segundo, com R$ 17,1 milhões, enquanto bilheteria vem na sequência, com R$ 16,1 milhões. R$ 34,4 mil são de outras receitas diversas com futebol, R$ 5,5 milhões com publicidade, R$ 3 milhões com sócio-torcedor, R$ 2,6 milhões divididos com licenciamentos, escolinha e loterias, e R$ 1,2 milhões em direitos econômicos de atletas.

Gol de placa da Drebor

O resultado do Cuiabá é uma vitória para a Drebor, empresa fabricante de material utilizado por recapeadoras de pneus que foi fundada há mais de 30 anos, dona do clube desde 2009. Fundado em 2001, a equipe disputou sua primeira competição profissional em 2003. Luís Carlos Tóffoli, o Gaúcho, centroavante que defendeu times como Palmeiras e Flamengo nos anos 80 e 90, era o dono do time na época. Gaúcho apresentou o Cuiabá para Manoel Dresch, dono da Drebor, falecido em fevereiro de 2023, e a relação entre a empresa e o clube começou.

"O primeiro ano que a gente se envolveu com o Cuiabá foi em 2003. O intuito inicial era para divulgar a marca da empresa, mas o fato da minha família gostar de futebol também influenciou. Patrocinamos o clube de 2003 a 2005", conta Cristiano Dresch, vice-presidente do Cuiabá, em entrevista exclusiva à EXAME. Ele afirma que os valores pagos na época eram maiores do que praticado no mercado. "Colocamos muito dinheiro no clube", afirma.

A relação entre Gaúcho e Manoel se deteriorou com o tempo e a parceira foi encerrada em 2005, mas esse não era o fim da história da empresa com o clube. Por problemas financeiros, o Cuiabá ficou entre 2007 e 2008 sem disputar competições oficiais. O Gaúcho se afastou do Dourado e foi quando Manoel viu a chance de voltar ao clube, mas dessa vez com poder de decisão. "O que fez meu pai querer comprar o Cuiabá em 2009 foi a construção da Arena Pantanal, quando a cidade foi confirmada como sede da Copa do Mundo de 2014. Ele viu a oportunidade de pegar um clube de Mato Grosso e colocar na série B. Não imaginávamos naquele momento que chegaríamos na série A", explica Cristiano. O valor da compra nunca foi revelado.

O grupo Drebor decidiu que o Cuiabá seria uma empresa e não um clube associativo, antes mesmo da Lei da Sociedade Anônima do Futebol (SAF). Em 2021, quando a lei foi regulamentada, o clube apenas migrou para a SAF.

Naquele ano começou a caminhada do Cuiabá rumo a elite do futebol brasileiro. O time voltou do licenciamento na segunda divisão do campeonato mato-grossense e conseguiu o acesso para a primeira divisão do estadual no primeiro ano da nova administração. Em 2o11, o time conquistou o primeiro título sob o comando da Drebor, o estadual, e conseguiu subir para a série C no campeonato nacional. Dali em diante, o Cuiabá passou por um dos momentos mais difíceis desde sua retomada. "Passamos por situações bem difíceis no projeto e quase fomos rebaixados para a série D", revela o vice-presidente.

Foi então, após nove temporadas na terceira divisão do futebol brasileiro, que o Dourado conseguiu o acesso para a série B. Com apenas duas temporadas na segundona, o clube garantiu o acesso para a elite em 2020. "Foi um crescimento gradual, sempre com os pés no chão. O resultado financeiro de 2022 com certeza acontece por estar na série A, porque boa parte do dinheiro é das cotas de televisão. A forma que administração também tem relação com esse sucesso. A nossa estrutura é enxuta", garante Cristiano.

Cultura de empresa, o olho do dono no dia e contas em dia

A estrutura do Cuiabá tem Cristiano como vice-presidente, e seu irmão, Alessandro Dresch, três anos mais novo, como presidente do clube. Os dois administram o clube em conjunto. Quando ainda estava vivo, Manoel Dresch também era consultado sobre decisões importantes. Ele afirmou que tem contato diário com os jogadores, o técnico da equipe e os funcionários do clube. "Uma coisa que acredito é o olho do dono no dia. Com isso conseguimos ter um custo operacional menor que dos outros clubes", disse.

A experiência com a estrutura de uma empresa como a Drebor é um dos grandes diferenciais do clube em comparação com os outros times da elite do futebol, e isso inclui os que se tornaram SAF nos últimos anos. "Vejo outros clubes da série A com estruturas administrativas muito maiores que a nossa. O que uma pessoa faz aqui no Cuiabá, os outros têm três, quatro pessoas", revela.

Cristiano afirma que no Cuiabá a cultura é pela eficiência para reduzir os custos. Ele garante que isso não significa que os funcionários não são bem remunerados. "Acreditamos que remunerar bem os funcionários e ter políticas de premiações satisfatórias para todo mundo, e não só para os atletas, é extremamente importante para tudo funcionar bem", explica.

Outro trunfo do clube mato-grossense é não ter dívidas. Como o clube começou como empresa, a administração sempre evitou gastar mais do que arrecadou. Segundo estudo da Sports Value, consultoria especializada em marketing esportivo, o Cuiabá é o clube menos endividados do Brasil com apenas R$ 2 milhões de dívidas. O Atlético-MG e o Cruzeiro, por exemplo, têm uma dívida 500 vezes maior que do Cuiabá, cerca de R$ 1 bilhão cada.

Apesar do controle rígido de gastos, o Cuiabá já precisou de ajuda do grupo Drebor. A empresa chegou a fazer empréstimos para o clube, que de acordo com o balanço financeiro, foram quitados.

Os objetivos do Cuiabá para 2023

Para 2023, o Cuiabá tem três objetivos claros. Um deles é a reforma de seu novo centro de treinamento, que será batizado de Manoel Dresch, em homenagem ao idealizador do projeto do clube. A estrutura está orçada em R$ 50 milhões e terá cinco mil metros de área construída. A previsão de entrega é para o começo de 2024.

"O principal objetivo é melhorar a estrutura. Nosso centro de treinamento já está sendo construído e uma parte dele já é até utilizada. Agora estamos construindo outras novas áreas, além da melhoria do nosso quadro de colaboradores", acrescenta Cristiano.

A outra meta é a manutenção no Campeonato Brasileiro. Hoje, o clube ocupa o meio da tabela e tem conseguido pontos importantes contra times que também disputam a permanência na elite do futebol brasileiro. "A permanência na série A é a principal meta do clube para esse ano também", admite o vice-presidente do clube.

Cristiano também garante que o clube espera ter um resultado tão bom quanto o de 2022, por isso a terceira meta do ano é seguir com uma gestão eficiente.

Foco na categoria de base

Questionado sobre o que Cuiabá planeja para as próximas temporadas, Cristiano fez um mea-culpa e afirmou que como o foco do clube por anos foi subir de divisão, a atenção para formação de atletas e na modernização da estrutura do clube ficou de escanteio. "Um clube como o Cuiabá não consegue comprar um jogador por um valor muito alto, com um salário de mais um milhão de reais. Por isso precisamos formar", afirma.

O vice do clube garante que nos últimos três anos, o clube investiu pesado na estrutura e nas categorias de bases. A intenção é revelar para ter material humano para seguir na primeira divisão, além do potencial de receita com venda de jogadores para clubes brasileiros com maior poder financeiro ou até para europeus. "No momento [que revelar mais jogadores] teremos uma sustentabilidade bem maior que temos hoje", garante.

 

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