A Justiça Eleitoral de São Paulo aceitou a denúncia do Ministério Público e tornou réu o ex-ministro e ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab (PSD) pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro, caixa 2 eleitoral e associação criminosa.
Kassab foi denunciado pelos crimes em fevereiro e negou, na ocasião, ilicitudes, afirmando que iria provar que os recursos eram de origem lícita. Nesta quinta-feira (11), após a denúncia ser aceita, a reportagem voltou a procurar a defesa do ex-prefeito, mas não recebeu posição até a última atualização desta reportagem.
A acusação diz que Kassab recebeu, entre janeiro de 2014 e dezembro de 2016, quantia superior a R$ 16 milhões indevidamente do frigorífico JBS em razão de sua função de ministro, "antes e depois de assumi-la". Na decisão que aceitou a denúncia, o juiz Marco Antonio Martin Vargas, da 1ª Zona Eleitoral de SP, afirmou haver "indícios da ocorrência dos crimes", "bem como da autoria".
"Com efeito, da análise dos elementos informativos coligidos durante as investigações, extrai-se um conjunto convergente de indícios suficientemente seguros, idôneos e aptos a indicar, nesta fase processual, a plausibilidade da tese acusatória erigida no sentido de que o acusado Gilberto Kassab teria recebido vantagem indevida em razão da função, de modo continuado, entre janeiro de 2014 e dezembro de 2016, no montante de R$ 16.550.000,00, parte do qual, em tese, por meio de doações eleitorais não contabilizadas durante a campanha de 2014 ao Senado Federal", escreveu o magistrado.
O juiz afirmou ainda que, apesar de ser o recebimento da denúncia uma análise inicial, não teria como aceitar os argumentos da defesa de Kassab "inépcia da denúncia e ausência de justa causa" para o processo. Segundo Martin Vargas, além da delação premiada de executivos da JBS, há muitas provas no inquérito da Polícia Federal que enfatizam a importância de se analisar com mais profundidade o caso.
Quando houve a denúncia, em fevereiro, Kassab disse, em nota, que "já apresentou farta documentação que demonstra, de forma cabal e inequívoca, que houve a real e efetiva prestação dos serviços dos dois contratos, com valores adequados e compatíveis com os praticados no mercado, executados mediante relação contratual entre empresas privadas" e "sem prejuízos ao erário".
O ex-prefeito também disse que "reafirma a lisura de seus atos e sua total confiança na Justiça, com a certeza de que restará comprovada a correção de todos os atos apurados" (veja a íntegra da nota enviada em fevereiro baixo).
Presidente nacional do PSD, Kassab ocupou os postos de ministro das Cidades em 2015 e 2016 e, posteriormente, o de ministro da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações a partir de 2016, nos governos de Dilma Rousseff (PT). Em 2014, ele concorreu a uma vaga no Senado Federal.
Os pagamentos, de acordo com os promotores que participaram da investigação, envolveram Flávio Castelli Chueri e Renato Kassab, também denunciados no mesmo processo. O repasse era feito mediante contrato fictício entre a JBS e a empresa Yapê Assessoria e Consultoria LTDA, controlada pelo ex-ministro até 2014.
No documento, os promotores afirmam que a "denúncia está inserida nas relações de interesse do Grupo J&F com agentes políticos dos Poderes Legislativo e Executivo, agentes públicos, Bancos Públicos e Fundos de Pensão, desde o ano de 2006, com o objetivo de assegurar boas relações, bem como viabilizar a captação de recursos para o financiamento dos seus projetos de implantação e expansão, em diferentes ramos de atividade da economia".
A Polícia Federal havia indiciado Gilberto Kassab em 22 de fevereiro. O inquérito contra o ex-prefeito era conduzido por integrantes da PF na chamada "Lava Jato Eleitoral" – grupo formado por policiais federais e promotores eleitorais paulistas a partir de delações feitas pela extinta força-tarefa de Curitiba. Em 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu mandar para as justiças eleitorais casos de corrupção e lavagem de dinheiro relacionados a caixas 2 de campanhas.
As principais provas contra Kassab vieram da colaboração premiada de executivos do Grupo J&F, holding que controla algumas das maiores empresas do país, como a JBS, o Banco Original e a Eldorado Celulose, feitas no âmbito da Lava Jato.
Em acordo homologado pelo STF, em 2017, os colaboradores Wesley Batista e Ricardo Saud disseram ter repassado R$ 58 milhões a Kassab. Desse total, R$ 30 milhões se referem a um pagamento mensal de R$ 350 mil que os executivos do grupo dizem ter feito a Kassab entre 2010 e 2016.
"A defesa esclarece que já apresentou farta documentação que demonstra, de forma cabal e inequívoca, que houve a real e efetiva prestação dos serviços dos dois contratos, com valores adequados e compatíveis com os praticados no mercado, executados mediante relação contratual entre empresas privadas. Os valores foram regularmente recebidos em decorrência de uma atividade empresarial lícita que não guarda relação com eventuais funções públicas, nem com atividade político partidária exercidas. Vale destacar que em nenhum momento foi apontado prejuízo ao erário e que os contratos, lícitos e regulares, foram celebrados nos anos de 2013 e 2014, período em que o ex-prefeito estava na iniciativa privada e não ocupava cargo público, e que ele se afastou do quadro societário antes de voltar a assumir cargos públicos em 2015, não tendo recebido quaisquer valores relacionados a esses contratos após meados de 2014. Todas as doações recebidas pelo PSD seguiram a legislação vigente à época e o posicionamento do partido nas eleições de 2014 foi definido em convenção, com votação dos membros de sua Executiva Nacional. O ex-prefeito reafirma a lisura de seus atos e sua total confiança na Justiça, com a certeza de que restará comprovada a correção de todos os atos apurados".
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