
O mês de dezembro carrega uma data que não pode passar despercebida: o Dia Mundial de Luta Contra a Aids, celebrado no dia 1º. A campanha Dezembro Vermelho, instituída pela Lei Federal nº 13.504/2017, mobiliza o país na luta contra o HIV, a Aids e outras infecções sexualmente transmissíveis. Mas essa luta não é apenas sobre números ou estatísticas. É, acima de tudo, sobre vidas ceifadas e marcadas pela dor do preconceito e pela agonia da falta de acesso ao tratamento.
Nos anos 1980 e 1990, o diagnóstico de HIV era uma sentença de morte. Não havia medicamentos, não havia esperança. Milhares de brasileiros morreram sem ter a chance de lutar pela vida. Morreram sozinhos, escondidos, envergonhados por uma doença que carregava o peso do estigma social.
Entre esses brasileiros estava Herbert de Souza, o Betinho. Sociólogo, ativista dos direitos humanos, criador da histórica Ação da Cidadania contra a Fome e a Miséria. Betinho era hemofílico (Distúrbio genético e hereditário que afeta a capacidade do corpo de coagular o sangue) e contraiu o vírus HIV nas constantes transfusões de sangue necessárias para tratar sua condição. Seus dois irmãos, o cartunista Henfil e o músico Chico Mário, também hemofílicos, tiveram o mesmo destino trágico. Os três morreram em decorrência da Aids.
Betinho não se deixou abater. Mesmo sabendo que estava com o vírus, fundou a Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (ABIA) em 1986, trazendo as discussões sobre o HIV para o Brasil e lutando pela construção de políticas públicas de saúde. Ele dizia que sua condição de soropositivo o forçava a “comemorar a vida todas as manhãs”.
Mas há uma dor maior que a doença, o preconceito. Quantos brasileiros anônimos, hemofílicos como Betinho, contraíram o vírus da mesma forma e morreram deixando dúvidas entre familiares? Quantos foram julgados injustamente, tiveram suas memórias manchadas pelo estigma de uma doença contraída em um ato de tentar sobreviver?
O preconceito mata tanto quanto o vírus. Mata a dignidade, os laços familiares, a memória. Durante décadas, o HIV foi erroneamente associado apenas à população LGBTQIA+, quando, na verdade, desde os anos 1980 até 2010, mais de 87% dos casos no Brasil ocorreram entre homens e mulheres heterossexuais. O preconceito cegou a sociedade: o vírus não escolhe orientação sexual, classe social ou raça. O vírus é democrático na sua crueldade.
Hoje, a ciência avançou. Os medicamentos antirretrovirais permitem que pessoas vivendo com HIV tenham vida longa e saudável. Quando o tratamento é seguido corretamente, a pessoa atinge o estágio indetectável, não transmite o vírus e mantém qualidade de vida. Mas o preconceito persiste e impede que muitos busquem diagnóstico precoce e tratamento.
A campanha Dezembro Vermelho é mais que uma data simbólica. É uma oportunidade de educar, conscientizar, combater o preconceito e salvar vidas. O HIV não é uma sentença de morte. Mas o preconceito e a falta de políticas públicas podem ser. Que Mato Grosso se vista de vermelho em dezembro. Vermelho de luta, de esperança, de vida.
A Verdade MT não se responsabiliza pelos comentários aqui postados. A equipe reserva-se, desde já, o direito de excluir comentários e textos que julgar ofensivos, difamatórios, caluniosos, preconceituosos ou de alguma forma prejudiciais a terceiros. Textos de caráter promocional, inseridos sem a devida identificação do autor ou que sejam notadamente falsos, também poderão ser excluídos.
Lembre-se: A tentativa de clonar nomes e apelidos de outros usuários para emitir opiniões em nome de terceiros configura crime de falsidade ideológica. Você pode optar por assinar seu comentário com nome completo ou apelido. Valorize esse espaço democrático agradecemos a participação!